Eugénio sobre Irene

Leio a entrevista que Eugénio Lisboa concedeu ao JL desta semana. E pergunta-lhe Luís Ricardo Duarte: «Que autor gostaria de ver mais valorizado hoje em dia?». Eugénio Lisboa responde: «Irene Lisboa, por exemplo, uma enorme escritora, imensamente esquecida. Na verdade, ela nunca teve a nível público a aceitação que teve da crítica. É uma pena porque a sua obra é muito apelativa e sedutora, quase eletrizante em muitos aspetos. Lembro-me da única vez que estive com ela, precisamente com o José Régio, no Chiado, em Lisboa. Acabava de lança rum livro e comentava: "Régio, deste não vendi um único exemplar".
Leio e sinto-me reconfortado comigo ante este esforço de a ter trazido aqui desde 2007 e remorsos por o fazer tão esparsamente. E dou comigo a pensar quantos poderão, naquele permanentemente malicioso modo de ver o mundo, pensar que Eugénio lembra Irene e saúda a valia da sua obra porque o comum apelido evidenciará uma ligação de família, donde um nepotismo cultural; e quanto isso é sintoma de uma grave doença social, a do descrédito de motivos nobres e de decência no viver, evidência de uma mentalidade doentia que só se alimenta da nitreira da suspeita porque nela vive e com ela prospera.
Em boa hora, pois, esta lembrança e este apelo. Irene Lisboa viu a sua obra publicada em versão quase integral pela Editorial Presença, com prefácio e anotação de Paula Morão. Muito pouco teve eco junto do público leitor. Pena que na colectânea que a Imprensa Nacional  editou em Março deste ano com os breves textos literários de Eugénio Lisboa, sob o título Uma Conversa Silenciosa, não haja menção àquela magnífica escritora, pois a completar o apelo agora lançado haveria a detalhada explicação do seu porquê. Não que os possíveis leitores se entusiasmassem com isso, pois a leitura hoje, a que subsiste, segue critérios de sem razão, sim porque, a reforçar os que lêem, se acharia a visão aguda de quem, pela sua notável cultura e sentido humano, ali melhor encontraria o que ao ler folheando passa despercebido.

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A fotografia pertence ao arquivo da revista Visão. As citações faço-as submisso à grafia que se tornou oficial, de coração apertado.