Lembrei-me disso este fim de tarde tarde, desses críticos enfastiados, ausentes dos lugares «onde a vida varie», fruto da clausura insolente e da alienação noctívaga. Talvez por ter almoçado sardinhas no senhor Manuel e porque comecei faz pouco o meu jantar a comer rodelas de ananás que a minha Adelina, que se chama outro nome vindo dos tempos medievais, me deixou ficar, dizendo com aquele modo bonito de dizer: «sabe o senhor José António que comer ananás faz as pessoas felizes? Tem um produto que eu não lembro o nome». «Não faz mal», respondi eu então, enquanto revia provas de um livro, «desde que me faça feliz».
A minha Adelina
O burro velho

Senti-a, por ali, tentadora, e ei-la de súbito: a livraria das livrarias, a Chaminé da Mota.
Contava os minutos, arriscava perder o comboio, mas o desejo era mais forte.
O que queria? Nem sabia. Tinha querido entrar e estava ali. «Procura algo?», perguntou-me, amável, o dono. Nem sei como surgiu, mas ripostei: «Irene Lisboa!».
Estavam lá em baixo, as mulheres escritoras, todas juntas, em gineceu literário.
Enervado com a pressa, tartamudeando o «já tenho quase tudo dela», acrescentei, sem ser necessário um «deram-me agora mais uns quantos», e com o empregado em expectativa, deitei a mão a um «Queres Ouvir? Eu Conto», editado pela Portugália do Agostinho Fernandes.
Tenho-o agora aqui comigo, impossível lê-lo esta noite, porque vai ser mais uma madrugada de trabalho obrigatório.
«Tinham deitado um burro à margem, um burro velho. Que carga de ossos tão triste». Começa assim o primeiro conto. Sou eu!
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